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17 ANOS DA LEI MARIA DA PENHA
ALE-RR realiza trabalho de acolhimento às vítimas de violência por meio do Chame

Norma que instituiu novas diretrizes para o enfrentamento da violência doméstica e intrafamiliar contra as mulheres no Brasil, a Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006) completa 17 anos nesta segunda-feira (7). Ao longo desse tempo, Assembleia Legislativa de Roraima (ALE-RR) fomenta discussões relacionadas ao tema, além de aprovar normas e realizar um trabalho multidisciplinar de acolhimento às vítimas por meio do Chame (Centro de Humanitário de Apoio à Mulher), ligado à Procuradoria Especial da Mulher.

 

Maria da Penha inovou ao estabelecer medidas de proteção, punição e prevenção de forma articulada entre os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, além de diversos órgãos públicos, como o Ministério Público, Defensoria Pública e a criação dos Juizados Especiais de Violência Doméstica e Familiar.

Um dos principais méritos da norma foi a tipificação da violência contra a mulher, que possibilitou o combate a diversas formas de agressões que nem sempre são visíveis na pele, como a violência física e a sexual, mas podem deixar marcas profundas, como a moral, a psicológica e a patrimonial.

Três leis que garantem maior visibilidade e conscientização sobre a legislação foram aprovadas pelo Poder Legislativo roraimense. A primeira delas, a Lei nº 1.004/2015, foi proposta pela parlamentar Aurelina Medeiros (PP). O ordenamento determina que a Lei Maria da Penha seja divulgada em todos os estabelecimentos públicos de ensino do Estado, utilizando diversos meios de comunicação, como cartazes, panfletos, banners, revistas, jornais impressos, murais e mídias no espaço escolar.

Já a Lei nº 1.524/2021, sugerida pela ex-deputada Betânia Almeida, institui a Semana Estadual Maria da Penha nas escolas, a ser realizada anualmente no mês de março nas unidades de ensino estaduais em observância ao mês internacional da mulher. E a Lei nº 1.786/2023, de autoria da ex-deputada Yonny Pedroso, além de instituir a campanha Agosto Lilás em Roraima, prevê a divulgação da norma por meio de ações de mobilização realizadas de forma articulada com organismos municipais de políticas para mulheres, sendo possível firmar parcerias e convênios com instituições governamentais e não governamentais, empresas públicas e privadas, movimentos sociais, conselhos de direitos e de classe.

O presidente do Poder Legislativo, deputado Soldado Sampaio (Republicanos), ressaltou o compromisso do Parlamento em promover medidas efetivas para erradicar a violência e garantir a segurança da população feminina em Roraima.

“A própria Lei Maria da Penha destaca a responsabilidade da família, da sociedade e do poder público para a garantia plena dos direitos das mulheres. E esta Casa sempre primou pelo fortalecimento das políticas públicas e promoção de ações de prevenção com intuito de erradicar esse tipo de crime. Esse embate é fortalecido por meio do Chame, que é uma ferramenta muito importante de apoio às vítimas, com acompanhamento multiprofissional. Há ainda os projetos de lei, que sempre serão prioridade e terão atenção necessária dos 24 deputados”, enfatizou Sampaio.

Violência em números

Apesar dos avanços inquestionáveis com a efetivação da Maria da Penha, ainda há muito a ser feito, especialmente em Roraima, onde os dados da última pesquisa divulgada pelo Anuário Brasileiro de Segurança Pública, apresentados pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, apontaram um preocupante aumento em diversas formas de violência contra mulheres de 2021 a 2022. Casos de estupro passaram de 553 para 726 ocorrências, representando um aumento de 28,1%; os registros de estupro de vulnerável subiram de 405 para 554 casos.

As tentativas de estupro se mantiveram estáveis em 55 casos durante o período analisado, porém, houve um aumento expressivo nos casos de assédio sexual e importunação sexual, com um crescimento de 95,1%, enquanto os registros de violência psicológica saltaram de 3.370 para 4.494. A Justiça concedeu um maior número de medidas protetivas, passando de 1.586 para 1.883, e as ameaças cresceram de 2.756 para 3.663 registros.

Segundo a coordenadora estadual de Políticas Públicas para as Mulheres e diretora-geral da Casa da Mulher Brasileira (CMB), Graça Policarpo, os números, especialmente do Norte do país, refletem o parco acesso à denúncia. Em relação a Roraima, Policarpo ressalta que os resultados expressivos ainda estão aquém do esperado.

“É sabido que nós temos agora uma pesquisa sobre o panorama da violência no Brasil, que abrange violência de todas as formas, elas crescem a cada dia e esses altos índices de violências, você percebe, elas estão mais no Norte, é onde temos uma dificuldade maior de denúncia. Mas aqui em Roraima a violência é muito maior, já que os números seriam bem maiores se não houvesse subnotificações”, avalia a coordenadora.

Mesmo com as subnotificações, ela aponta que o trabalho contínuo em segurança, prevenção e acolhimento de equipamentos públicos têm contribuído para o aumento, tornando as mulheres mais encorajadas a denunciar.

“Percebemos que os números são altos em Roraima também porque as mulheres estão denunciando mais. Significa que nós estamos trabalhando na prevenção, significa que o Estado leva mais segurança para que essas mulheres possam denunciar, e a tendência é que quanto mais se trabalha a questão da segurança, da prevenção, mais denúncias vão acontecer. Depois vem o contrário, quando aí vai diminuir, quando isso ocorrer, conseguiremos alcançar nossos desafios, que é acabar com a violência contra as mulheres”, afirma Policarpo.

Frente às estatísticas

Em Roraima, um dos órgãos que têm desempenhado papel fundamental no registro, proteção e amparo às mulheres vítimas de violência é o Centro Humanitário de Apoio à Mulher (Chame). Vinculado à Procuradoria Especial da Mulher da ALE-RR, o centro oferece desde 2009 atendimento multidisciplinar gratuito às vítimas, abrangendo suporte jurídico, social e psicológico, além de reeducação comportamental aos agressores através do Centro Reflexivo Reconstruir desde 2016.

“Contamos com psicólogos, assistentes sociais e advogados em nossa rede de apoio, para assegurar que a mulher não seja revitimizada. Realizamos uma escuta conjunta com os três profissionais simultaneamente e, a partir das informações compartilhadas pela vítima, identificamos o crime, adotamos as medidas necessárias e fornecemos o apoio psicológico crucial para fortalecê-la. Em alguns casos, oferecemos até sessões adicionais com a psicóloga até que a mulher se sinta fortalecida para tomar decisões, como solicitar uma medida protetiva ou qualquer outro recurso necessário”, esclareceu Magdalena Schafer, advogada do Chame.

Desde a fundação, o centro realizou 11.185 atendimentos presenciais. Do total, 1.837 são relacionados a casos de violência física – ato contra a integridade ou a saúde corporal, enquanto 2.483 direcionados às vítimas de violência psicológica – quando a conduta causa danos emocionais e diminuição da autoestima, e em terceiro vem a violência moral, com 1821 casos. Além disso, foram registradas 2.356 escutas remotas por meio do ZapChame [(95) 98402-0502], com 161 registros referentes a violência física, 330 casos de violência psicológica e 192 de moral.

Schafer observa que as estatísticas retratam a maneira gradual como a maioria dos casos de violência contra a mulher acontece, envolvendo frequentemente agressões psicológicas que muitas vezes passam despercebidas devido ao desconhecimento das leis de proteção.

“A violência contra a mulher é como um ciclo, que não começa diretamente com feminicídio, mas avança em etapas. Geralmente, começa com agressões, desvalorizações, xingamentos e a perda da autoestima. Em seguida, surgem ameaças e restrições à liberdade, como impedir a vítima de sair, trabalhar ou até mesmo escolher suas próprias roupas, podendo se intensificar com empurrões, tapas e socos, chegando ao ponto de causar danos físicos!”, disse.

Os dados coletados pelo Chame corroboram com os da Casa da Mulher Brasileira (CMB), que integra o programa “Mulher, Viver sem Violência” do Ministério dos Direitos Humanos (MDH) e envolve diversas instituições engajadas na luta contra essa questão, tais como o Juizado Especial, o Núcleo Especializado da Promotoria, o Núcleo Especializado da Defensoria Pública e a Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher (Deam).

Somente nos primeiros seis meses deste ano, a Casa atendeu 3.460 casos de violência, como assédio moral, cárcere privado, violência física, violência moral, violência patrimonial, violência psicológica e violência sexual. Dentre elas, sobressaem 1.301 de natureza psicológica, seguidos por 976 casos de violência moral e 638 registros de violência física.

Diante desses cenários, quem trabalha diretamente com as mulheres que dão rostos a essas estatísticas faz um alerta de que, além dos órgãos governamentais, é fundamental que toda a sociedade se mobilize e reveja paradigmas, para criar um ambiente seguro no qual as vítimas possam denunciar sem medo e garantir seus direitos e dignidade.

“O enfrentamento da violência doméstica e familiar contra as mulheres, idosos e crianças é uma responsabilidade coletiva que exige ação contínua e o engajamento de toda a sociedade. As mulheres estão sujeitas a diversas formas de violência, assim como os grupos vulneráveis, principalmente por serem vítimas de uma violência silenciosa, que gera receio de denunciar devido a possíveis represálias do agressor. O processo de denúncia não é fácil, e ainda há muitos obstáculos para encorajá-las, uma vez que a sociedade tende a culpabilizá-las, seja por sua aparência, comportamento ou por fatores externos. Essa culpabilização contribui para a perpetuação da violência”, concluiu Graça Policarpo.

Maria da Penha

Lei nº 11.340/2006, conhecida como Lei Maria da Penha, foi nomeada em homenagem à Maria da Penha, que sofreu uma tentativa de feminicídio pelo seu companheiro, resultando em sua paraplegia. A batalha pela condenação do agressor começou em 1983.

Após dois julgamentos (1991 e 1996), nos quais o ex-companheiro saiu impune, ela denunciou o caso à Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (CIDH/OEA), obtendo reconhecimento internacional.

Em 2001, a Comissão responsabilizou o Brasil por omissão estatal na violência doméstica contra as mulheres brasileiras, fazendo recomendações para combater a impunidade dos agressores e melhorar a proteção, reparação e dispositivos legais para as vítimas.

Em abril de 2023 foi sancionada a Lei nº 14.550 com alterações na Lei Maria da Penha para garantir que medidas protetivas de urgência sejam concedidas, quando houver riscos  à integridade física, psicológica, sexual, patrimonial ou moral da vítima ou de seus dependentes, independentemente de registro de boletim de ocorrência ou de ação na Justiça.

A mudança na legislação também assegura que a Lei Maria da Penha seja imposta em todos os casos de violência doméstica e familiar “independentemente da causa ou da motivação” e da condição do agressor ou da vítima.

Canais de atendimento à mulher:

  • Procuradoria Especial da Mulher (PEM) em Boa Vista (Chame e Centro Reflexivo Reconstruir): localizada na avenida Santos Dumont, 1470, bairro Aparecida, com atendimento de segunda a sexta-feira, das 8h às 18h.
  • Núcleo da PEM em Rorainópolis: os moradores do Sul do Estado podem buscar apoio na Rua Senador Hélio Campos, sem número, BR-174. O serviço multidisciplinar funciona de segunda a sexta-feira, das 8h às 18h.
  • Atendimento remoto pelo ZapChame: disponível no número (95) 98402-0502, atende 24 horas, inclusive nos fins de semana e feriados.
  • Casa da Mulher Brasileira: funciona todos os dias, 24 horas, na Rua Uraricoera, s/n, bairro São Vicente.

Texto: Suellen Gurgel

Fotos: Eduardo Andrade/ Marley Lima/ Nonato Sousa

SupCom ALE-RR

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